Something old, something blue

Eu começo esse texto sem saber muito por onde. Eu não sei se agradeço o que, eu espero, deve estar pra acontecer. Eu não sei se enumero os percalços até aqui. Eu vivi. E isso é basicamente o que há pra se dizer, sobre quem morre ou sobre quem permanece vivo, nesse caminho que a gente traça enquanto o caos nos atravessa. Eu vivi.

II

Eu tenho medo de ficar feliz antes da hora – mais medo, aliás, do que o medo que sinto de perder a hora quando a felicidade passar. Porque, você sabe, isso também acontece.

Eu amei um homem, já faz tempo, e ele me amou de volta com seus olhos negros e fundos de quem nasceu no mar. Ele me amava e eu, tendo só a inabilidade como companheira, sofri. Sofri por quase todos os nossos dias, de uma angústia sem nome, uma ânsia sem forma. De medo.

Carreguei por esses dias todas as certezas do mundo, mas carreguei com mais força a certeza de que logo chegaria o meu dia de ser triste. E eu acertei.

Esse homem foi embora aos poucos e eu também não lhe pedi que ficasse – embora quisesse. Porque é assim que cresce, como uma flor que a gente cuida, o medo de ser feliz. Ele nos apavora, mas nos apavora menos do que o tamanho da felicidade quando ela dá sinais de que vai chegar.

III

Eu tenho medo dos meus planos e do que o futuro me reserva sem considerar minha vontade. Eu sinto dor de não poder gritar e no silêncio de cada noite eu sei, eu realmente sei que está mais próxima que antes a minha hora de ir embora – ou explodir.

E essa hora vai chegar, mas não agora.

Agora eu preparo a terra do meu verão. Aparo as arestas dos meus desejos, não para dominá-los, porque eu não posso, mas para que permaneçam fortes quando chegar a boa estação. Eu invento, enquanto faço, a receita da minha tradição e eu não sei de nada. Eu não conheço nada. Eu não pertenço a lugar nenhum e até hoje cuido de não ficar feliz antes da hora.

É porque antes dos começos e antes do ponto final, que são já pra mim a mesma coisa, eu aprendi pouco. Mas aprendi a não chorar ainda  pelos pedaços que eu ainda não perdi.

Deixe um comentário